Como Funciona o Golpe da Voz? O Passo a Passo dos Criminosos

A eficácia do golpe da voz reside na sua aparente simplicidade e na capacidade dos fraudadores de se passarem por representantes de instituições confiáveis. A operação é meticulosamente planejada em etapas, desde a abordagem inicial até a aplicação final da fraude. Entender esse processo é o primeiro passo para criar uma barreira de proteção eficaz.

A Abordagem Inicial: O Falso Contato Oficial

Tudo começa com uma ligação inesperada. Os criminosos, utilizando técnicas de "spoofing" para mascarar o número de origem e fazê-lo parecer legítimo, entram em contato com a vítima. Eles se apresentam como funcionários de bancos, operadoras de cartão de crédito, empresas de telefonia, institutos de pesquisa ou até mesmo órgãos governamentais, como o INSS ou secretarias de saúde.

O pretexto varia, mas o objetivo é sempre o mesmo: engajar a vítima em uma conversa e extrair palavras-chave. As desculpas mais comuns incluem:

• Atualização cadastral obrigatória;
• Confirmação de uma compra suspeita;
• Oferta de um novo produto ou serviço com condições imperdíveis;
• Realização de uma pesquisa de satisfação;
• Agendamento de um procedimento ou vacinação.

A Extração da Voz: Engenharia Social em Ação

Durante a conversa, os golpistas utilizam técnicas de engenharia social para manipular a vítima e fazê-la pronunciar palavras específicas, que são gravadas. O principal alvo é a palavra "Sim". Para isso, fazem perguntas diretas e aparentemente inofensivas, como "O senhor(a) é [nome completo da vítima]?", "Podemos prosseguir com a confirmação?" ou "Você está me ouvindo bem?".

Além do "sim", eles podem tentar gravar a vítima dizendo "concordo", "autorizo", seu número de CPF ou o nome completo. Cada uma dessas gravações é um ativo valioso. Um simples "sim" gravado com a entonação e clareza certas pode ser editado e inserido em uma gravação para simular a aprovação de uma transação financeira, a contratação de um empréstimo ou a adesão a um novo plano de serviços.

A Tecnologia por Trás da Fraude: Edição e IA

Com os trechos de áudio em mãos, os criminosos partem para a fase tecnológica do golpe. Em sua forma mais básica, eles editam os áudios, recortando as palavras-chave e inserindo-as em outros contextos. Por exemplo, ao ligar para a central de atendimento de um banco, eles podem usar a gravação do "sim" da vítima para passar pela etapa de confirmação por voz.

Contudo, a ameaça tem se tornado ainda mais potente com o avanço da inteligência artificial (IA). Ferramentas de "deepfake" de áudio permitem que, a partir de uma pequena amostra da voz de uma pessoa, seja possível cloná-la e gerar frases completamente novas com aquela mesma voz. Isso significa que os criminosos não se limitam mais a usar apenas as palavras gravadas; eles podem criar diálogos inteiros, tornando a fraude praticamente indetectável para um familiar ou um sistema de autenticação menos robusto.

Principais Riscos e Consequências do Roubo de Voz

As implicações de ter a voz roubada e usada indevidamente são graves e abrangem desde perdas financeiras diretas até danos emocionais e de reputação.

Fraudes Financeiras e Contratação de Serviços

O alvo mais comum é o financeiro. Com a voz da vítima, os golpistas podem:

• Autorizar compras com cartão de crédito por telefone.
• Contratar empréstimos pré-aprovados em nome da vítima.
• Alterar senhas e dados de acesso em serviços bancários que usam biometria de voz como fator de segurança.
• Contratar planos de TV, internet ou telefonia de alto custo.

Extorsão Familiar e Falso Sequestro

Outra aplicação perversa é a extorsão. Os criminosos podem usar a voz clonada para enviar uma mensagem de áudio a um familiar, simulando uma situação de emergência, como um sequestro ou um acidente, e pedindo uma transferência urgente de dinheiro via Pix. O impacto emocional de ouvir a voz de um ente querido em perigo muitas vezes anula o raciocínio crítico, levando a transferências precipitadas.

Como se Proteger Efetivamente do Golpe da Voz?

A prevenção é a arma mais poderosa contra esse tipo de fraude. Adotar uma postura de ceticismo saudável e seguir algumas diretrizes de segurança pode neutralizar a ação dos golpistas.

1. Desconfie de Ligações Inesperadas

Seja cético com qualquer contato não solicitado, mesmo que o número pareça ser de uma empresa conhecida. Lembre-se que instituições financeiras raramente pedem confirmação de dados sensíveis ou senhas por telefone em uma ligação iniciada por elas.

2. Evite Dizer "Sim"

Treine-se para evitar respostas monossilábicas. Em vez de "sim", use alternativas como "Pois não?", "Estou ouvindo", "Do que se trata?" ou "Em que posso ajudar?". Ao ser perguntado se você é fulano, responda com outra pergunta: "Quem gostaria de falar com ele(a)?".

3. Desligue e Verifique

Na menor suspeita, a melhor atitude é desligar a chamada. Em seguida, procure o número oficial da instituição (no site, aplicativo ou no verso do seu cartão) e entre em contato para verificar se a ligação era de fato legítima. Nunca use os contatos fornecidos pelo suposto atendente.

4. Não Forneça Dados Pessoais

Jamais confirme ou forneça seu nome completo, CPF, data de nascimento, senhas ou códigos de segurança em ligações não iniciadas por você.

Fui Vítima, e Agora? O Que Fazer?

Se você acredita que caiu no golpe da voz ou que seus dados foram comprometidos, é crucial agir rapidamente para minimizar os danos.

1. Registre um Boletim de Ocorrência (B.O.): Dirija-se à delegacia de polícia mais próxima ou utilize o sistema de delegacia online do seu estado para registrar um B.O. Esse documento é fundamental para contestar cobranças indevidas e formalizar a ocorrência.

2. Contate Imediatamente as Instituições Financeiras: Informe seu banco e operadoras de cartão sobre o ocorrido. Peça o bloqueio de cartões e o monitoramento de atividades suspeitas em sua conta. Conteste qualquer transação desconhecida.

3. Monitore Suas Informações: Verifique regularmente seus extratos bancários e faturas de cartão. Considere monitorar seu CPF em serviços de proteção ao crédito, como Serasa e SPC Brasil, para identificar a abertura de contas ou contratação de serviços em seu nome.